Este livro conta como um indiozinho que vai à cidade pela primeira vez percebe as coisas da cidade! Para ele, é tudo tão diferente do mundo que conhece... Será que ele vai gostar?
Curte aí um pedacinho! O legal é que o autor é índio!
Na caixinha de morar (Daniel Mandaruku)
Quando chegamos à cidade, o sol já estava adormecido fazia tempo, mas não dava para ver as estrelas, por causa da luz que havia nas casas e nas ruas. Me deu saudade mais uma vez, mas a sonolência não permitiu ficar pensando nas coisas da aldeia.
Fomos levados para um lugar que achei bem estranho. Não era apenas uma casa, mas uma espécie de caixa igual a essas que a gente faz para colocar a mandioca depois de ralada.
Esse lugar, que todos chamam de prédio, é estranho porque as pessoas não usam as pernas para subir, mas são carregadas por uma outra caixinha, que sobe e desce o dia todo. Ela é tão pequenina que achei que fosse uma espécie de buraco onde a gente coloca os que morrem. Meu pai disse que isto que sobe e desce, carregando pessoas para as caixinhas onde elas moram, se chamam elevador.
Quando chegamos à nossa caixa, não encontrei redes de dormir, mas camas bem molinhas e boas de pular em cima. Tinha uma porção de lugares que a gente podia ir quando quisesse, mas com uma única diferença: não havia árvores para a gente brincar ou apanhar frutas. Tudo era esquisito. Lembro que comentei com o meu pai que devia ser bem difícil ser criança naquele lugar, pois não tinha lugar para fazer fogo; não tinha rio para nadar, nem para se banhar, apenas uma latinha que jogava água do céu como se fosse chuva e a gente ficava debaixo dela durante um bom tempo.
Comecei a ficar com vontade de voltar para casa.
Fiquei pensando como eles conseguem construir algo tão estranho, tão frio, tão morto. Pensei isso porque a nossa casa é feita com o corpo de nossas irmãs árvores e coberta com os cabelos das palmeiras, nossas parentas. Nossas casas são construídas uma em frente da outra só para gente poder olhar para nossos visinhos, conversar com eles e saber como cada um está. Aqui até parece que uns tem medo dos outros.
O DIÁRIO DE KAXI – Um curumim descobre o Brasil.São Paulo: Salesiana, 2001, p.16-17.